"Não é festa, é revolução!". Com
essa frase dita ao comandante da Intendência boliviana em Xapuri (AC), Plácido
de Castro deu início à terceira tentativa de tornar independente o território
do Acre, no dia 6 de agosto de 1902, mesmo dia em que a Bolívia comemorava sua
libertação do domínio espanhol.
A
escolha da data pode soar irônica, mas foi apenas uma escolha estratégica de
Castro, um gaúcho de 26 anos que já havia lutado na Revolução Federalista, no
Rio Grande do Sul, alguns anos antes e estava no território acreano para
trabalhar como agrimensor.
Apesar
do aniversário da Revolução Acreana ser comemorado no dia 6 de agosto, a luta
dos brasileiros, vindos na maioria da região Nordeste do Brasil, para ocupar o
território do Acre e torná-lo independente da Bolívia começou anos antes.
"A
Revolução é resultado de um longo processo histórico que se vivia, não só no
Acre como na Amazônia, que foi o primeiro ciclo da borracha. A borracha se
tornou tão valiosa quanto ouro, o que fez com que milhares de brasileiros
subissem os rios atrás. Por isso, o Acre foi ocupado", explica o
historiador Marcus Vinícius das Neves.
A ocupação do território acreano por brasileiros começou por volta de 1880.
Inicialmente o governo boliviano não deu muita atenção, já que se tratava de
uma região de difícil acesso e que até então, não possuía grande importância
econômica. Foi só quando o coronel boliviano José Manuel Pando teve que se
refugiar na região, após uma tentativa de golpe, que se deu conta do tamanho da
presença brasileira e buscou alertar o governo.
"Quando
o governo da Bolívia, em 1899, pretendeu se estabelecer no Acre e cobrar os
impostos da borracha, houve uma revolta brasileira que deu origem ao processo
que a gente chama de Revolução Acreana", conta Neves.
Galvez e as Repúblicas Independentes do Acre
A primeira insurreição contra o domínio espanhol, ocorreu em julho de 1899,
quando o jornalista e diplomata espanhol Luís Galvez Rodriguez de Arias
proclamou a República Independente do Acre. O governo de Galvez durou apenas
100 dias, pois, ele foi destituído do cargo pelo Exército brasileiro, que
respeitando o Tratado de Ayacucho, assinado entre os dois países em 1867,
considerava o Acre território boliviano.
Em novembro do ano seguinte, uma nova insurreição. Liderados pelo jornalista
Orlando Correa Lopes um grupo de brasileiros tenta novamente proclamar a
República Independente do Acre. O movimento, que ficou conhecido como
"Expedição dos Poetas", devido o grande número de jornalistas e
literatos que a compunham, foi facilmente expulso do território pelos
bolivianos.
Independência
A chegada de Plácido de Castro ao Acre finalmente mudou a sorte dos brasileiros
que desejavam se estabelecer no território.
"Quando
Plácido de Castro, à frente de um exército de seringueiros, invade a cidade de
Xapuri e a toma das autoridades, dá início a última fase da Revolução Acreana.
A fase mais sangrenta, que levou os seringueiros a pegar em armas e ir a luta
contra os bolivianos", ressalta Marcus Vinícius.
Segundo o historiador, até hoje não é possível saber com clareza quantas
pessoas morreram no conflito e qual lado teve mais perdas. Já que as histórias
são divergentes.
"As
fontes brasileiras aumentam a quantidade de vítimas brasileiras, diminuem a de
vítimas bolivianas, aumentam o número de tropas bolivianas e diminuem a
quantidade na tropa brasileira. E as fontes bolivianas fazem o inverso. Eu
estimo de maneira grosseira que cerca de 500 pessoas tenham morrido nos seis
meses que duraram esses combates", diz.
Os combates da Revolução Acreana duraram seis meses e terminaram janeiro de
1903 com a assinatura do Tratado de Petrópolis pelo qual o Acre passou a ser
reconhecido como parte do Brasil.
Toda essa história já foi contada em 'Amazônia de Galvez a Chico Mendes',
minissérie escrita pela novelista Glória Perez e que foi ao ar na TV Globo, em
2007 ia ao ar.
Legado da Revolução
Para o historiador, mais que anexação do território acreano ao Brasil, a
Revolução deixou marcas culturais que podem ser notadas ao longo dos últimos
112 anos.
"Foi
uma luta contra os estrangeiros para que o Acre se tornasse Brasil. Mas logo
depois o governo brasileiro criou no Acre um território federal e os acreanos
foram novamente à luta para que tivessem autonomia política e depois quando a
Ditadura Militar veio querer moldar o Acre e trazer os fazendeiros, houve novo
momento de resistência dos seringueiros contra a transformação da floresta em
pasto. Ou seja, o acreano tem na sua identidade uma marca de luta, resistência
e defesa do Acre que permaneceu por toda sua história e começa exatamente na
Revolução Acreana", reflete.